Um Barco

segunda-feira, 30 julho 2007

Sabor de Cajá

adropofsilence.mp3

Um gosto de cajá
Invadiu minha boca
Iluminou minha memória
Acendeu meu coração
Chamuscou minha paz

Com o gosto de cajá
Me vi a pensar em coisas
Além do que esperava
Aquém do que gostaria
Medida inexata do instante

No gosto do cajá
A partir da casca fina e lisa
Passando pela polpa rala
Chegando ao caroço áspero
Viagem ao amarelo presente

Do gosto do cajá
Outros sabores perdidos
Outras texturas e cascas
Outras polpas e caroços
Outros sentidos dormentes

Pelo gosto do cajá
Caminho de mil lembranças
Percorro o tempo vivido
Me reencontro no paladar
Me perco do presente

O gosto de um cajá
Provado na beira de estrada
Sabor persistente
Distante
Dissabor.

Filed under: Poesia — Um Barco @ 11:18 am

quarta-feira, 4 julho 2007

Tangenciar

strawberryfields.mp3

Tangenciar,
Tocar em um único ponto
No tempo, no espaço ou em ambos.
Num ponto apenas, só um contato.

Tangenciar,
Na passagem, um breve toque
Sem interseções, sem mesclas,
Sem matizes, nada, um ponto.

Tangenciar,
Sabendo que é breve, o encontro,
Sentindo que passará, que é único,
Como único é cada momento.

Tangenciar,
Sem memórias do contato,
Sem vestígios do encontro,
Sem registrar o que foi, o que passou.

Tangenciar,
É mais do que passar,
É menos do que deixar rastros,
É apenas o básico, é a essência.

Tangenciar,
Para não ficar à margem,
Para não interferir, não ser,
Apenas estar, naquele momento.

Tangenciar,
Para não sofrer influências,
Para não modificar o estado atual
De repouso, pura inércia.

Tangenciar,
Como princípio de vida,
Como um fim em si, o tudo.
Fugindo de si mesmo, do todo.

Filed under: Poesia — Um Barco @ 7:30 am

sábado, 21 abril 2007

Conjugação

mundo_nuevo_interludio.mp3

Não quis saber do futuro.
Nos tempos do deleite
Vivia só no presente, sorvia.
Passado era como um sonho,
Que logo desaparece
Ao levantar das pálpebras.
O futuro não me traria nada
Além do que já desfrutava.

Não quero saber do passado.
Atualmente, e mais que nunca,
Quero viver no futuro,
E deixar o passado ficar,
Principalmente quando não soma,
Quando subtrai do presente
O tempo valioso que uso
Para pensar em tudo que farei.

Pensarei muito no presente
Quando já for passado,
E o futuro chegar.
Viverei apenas num passado
Intangível, impalpável e, por isso,
Possível, já que só meu,
Subjetivo, interior, estático.
Por hora, não lembro, não penso, espero.

Filed under: Poesia — Um Barco @ 10:08 am

quarta-feira, 28 março 2007

Poemias

Em abril de 2004 Um Barco foi ao mar. Alguns posts e meses depois, um site literário chamado “Poemias” enviou um convite para que lá eu publicasse poemas de minha autoria.

Isso ocorreu em setembro do mesmo ano e pouco durou. Encaminhei, em datas diferentes, dois pequenos poemas que foram publicados, mas se apagaram como Poemias também se apagou, com o fechamento do site. Ficaram adormecidos.

Relutei em republicá-los, mas faço-o agora, em silêncio.

O Muro

O muro está ali, eu o sinto.
E não vejo como ou porque
Deveria escalá-lo,
Já que nem é tão alto assim.
Mas é um muro, uma parede,
E eu preciso!
Nem quero saber porque ou como,
Mas preciso, sinto isso!
Saber do outro lado
Ainda que seja só para ver
A mim mesmo, tentando me encontrar.

 

O Medo da Morte

Nem é da morte o medo,
É o medo de mais não ser.
É ser, e tão apenas.
Se apenas viver, mais nada
É nada mais que um desejo,
É um desejo puro, forte,
Eu, forte mesmo não sendo,
É sendo fraco que irei.
É, irei à luta e verei
Morrer o medo da morte.

Filed under: Poesia — Um Barco @ 12:17 am

terça-feira, 20 março 2007

Fênix

leclochard.mp3

Reconstruir-me,
De cada pedaço de mim
Ainda que uma cópia.

Regenerar-me
A cada golpe recebido,
Como a cabeça da hidra.

Reencontrar-me
Com o mesmo sol,
Como se em outro planeta.

Pensar-me pleno
De tudo que teria,
Se houvesse a chance.

Perder-me do triste,
Como num labirinto
Para chegar ao riso.

Reescrever-me
Com as mesmas palavras,
Em muitas formas.

Repintar-me
De muitas cores,
Na mesma imagem de mim.

Renascer, límpido,
Das cinzas frias
De cada manhã.

Reacender o fogo
De toda emoção,
A cada segundo.

Saber-me novo,
Sentir-me novo,
Mesmo não sendo.

Imaginar-me eterno,
Nas palavras gravadas
Nos olhos que me lêem.

Filed under: Poesia — Um Barco @ 9:47 pm
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