Quando um pouco ou quase nada
É o que enche até a borda,
Na sobra que nos resta,
Daquilo que era o tudo,
O que se tinha, o que foi dado,
O que escapou entre os dedos,
Quando o que fica é pouco,
E é só o resto do que foi
E a nós parece raso e parco,
Comparado com o que havia,
O real toma forma e se apresenta,
Como um vago devaneio no sonho.
Em meio ao vazio, a esperança
Teimosa, insistente, contumaz.
Em meio ao vazio, o olhar perdido
Num futuro inconstante, frio,
Naquilo que é apenas símbolo,
Na alegoria fugitiva do presente.
Em meio ao presente, o devaneio
Amigo constante, persistente, fiel.
Em meio ao presente, o olhar certo
Num futuro, agora sólido e cálido,
No símbolo que, para nós, representa
A alegoria última, delírio real.
Dia branco
(Alceu Valença)
Deusa da noite
Sangrenta e fria
Irmã da lua
Mulher da noite e do dia
Eu vim de longe
Atrás da brisa
Com sete pedras
Bordei a minha camisa
Pra ver a doida das lantejoulas
Dos lábios verdes de purpurina
Dançar na noite nos Quatro Cantos
Com seu vestido de bailarina
Fazer o riso, tremer o medo
Fazer o medo, virar sorriso
Fazer da noite dos Quatro Cantos
Um dia branco feito domingo