Nem verdade tristonha, nem mentira risonha, o carteiro, que nem meu nome gritou, deixou um envelope pardo que, pelo tamanho, sabia conter uma revista. Abri, sem ver o remetente, e vi você assim, velho forte, imponente, na capa, abrindo as comportas de meu passado.
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E lá estava você, em várias páginas, em vários ângulos, um dos quais, como esse, nunca visto por meus olhos de criança e adolescente. E lá estava eu, anos e anos atrás, invisível na foto, mas presente em cada lado, em cada parede inclinada, por onde deslizava sobre uma palha de coqueiro. | |
Em seu redor, as brincadeiras da infância e a contemplação adolescente do mar que você até hoje vigia, aquele mar ora azul, ora verde, escravo do clima, das algas e das águas-vivas.
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Velho forte das férias de minha infância e juventude. Perto de você me senti homem, ao receber o primeiro beijo, da primeira namorada. Alguns anos depois, algumas namoradas depois, bem a seu lado, numa noite, me senti humanamente falível, com a primeira bebedeira, por término de namoro (sim, levei um fora). | |
Quando a noite descia, lenta, sua silhueta emoldurada pelo laranja-vermelho-negro do mergulhar do sol nos dizia que era hora de voltar para casa, após um dia cheio de banhos de mar, jogos de bola, brincadeiras nas tardes mornas. E, muitas vezes, voltávamos para você à noite, velho forte, mar prateado pela lua, à beira do qual, em rodas de violão, tantas vezes cantava com os amigos amores ainda não vividos.
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Não morei perto de você, velho forte, a não ser nos meses de férias, mas me sinto agora, vendo as fotos da revista inesperada, bem próximo de novo às suas paredes, bem junto de meu passado, bem longe do meu presente que, de uma forma ou de outra, foi influenciado por você. Mas sinto, e bem forte, uma enorme paz, ao me lembrar de tudo isso.
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