Até quando verei a noite,
Vazia como uma saudade,
Tão escura quanto fria,
Mais crua que a verdade?
Até que ponto a escuridão
Vai me esconder da tristeza,
Quando o que me restar for nada
Além de ausência e certeza?
Até onde me levará a ilusão
Que sempre foi lanterna e guia
No instante em que o fim do túnel
Revelar o que eu não via?
Até, talvez, ao encontro vazio
Com nada além do que se espera,
Nada aquém do que se teme
Quiçá a última quimera.
Até porque a dúvida, amiga fiel,
Agora que tudo é mais claro,
Se afasta deixando a verdade,
Desencanto, desamparo.
Até que enfim e, certamente,
Até o fim de todo segredo,
Até que o sorriso se acabe, vazio,
Até outro sonho, outro medo.
Memória e Fado
(Egberto Gismonti & Geraldo Carneiro)
Por que o sonho terminava
Quando o dia amanhecia
No espelho
Vinha um medo desse gosto morto do passado
Mergulhado na memória
Eu não queria que a vida findasse no abismo desse quarto
Amargando amargurada solidão
Por que a hora se esvazia
Na memória do espelho
Como um fado
Teço o fio do meu sonho cheio de mistério
Um rosário de silêncio
E a minha boca fechada com medo das sombras desses anjos
Que se foram e não voltam nunca mais