Quantos albuns de retratos em branco e preto já organizamos, com instantâneos infelizes de nossa vida? Quantas vezes pronunciamos, até enfaticamente, aquela expressão emblemática “nunca mais!” para, dali a algum tempo embarcar numa viagem cujo destino antevemos, mas seguimos assim mesmo, porque o momento nos exige, nós nos exigimos?
É da natureza humana a repetição voluntária de ações com a conseqüente tomada de decisão que, sabemos, nos conduzirá a um mergulho melancólico interior, quando não na nossa tristeza abissal.
O que importa é o momento, o imediatismo de uma alegria fugaz (mas não vã): uma compra precipitada, a discussão impensada, a satisfação de um desejo.
Após o mergulho, a emersão, a recomposição, a necessidade, a ação.
E isso não chega a ser trágico, já faz parte de nosso código de vida, é nossa rede privada, a nos enredar e a nos direcionar. E é bom, quando é satisfatório.
Somos cíclicos, queiramos ou não. Circulares, num cotidiano seguro mas insatisfatório ou ondulatórios, com picos e vales de ânimo.
Essa reflexão me veio com a leitura do post de Loba. No comentário que fiz, disse-lhe que ela conheceria essa música, cíclica, mas que traz uma mensagem de renascimento, a emersão após o mergulho, o início de um novo ciclo.
Passacalha
(Edino Krieger e Vinicius de Moraes)
Nasci
Andei
Fugi
Voltei
Sorri
Chorei
Amei
Morri
Nasci – No mundo me encontrei
Andei – No sonho me perdi
Fugi – Na estrada me cansei
Voltei – Sozinho me senti
Sorri – Pra não chorar cantei
Chorei – Do tempo esqueci
Amei – E a esperar fiquei
Morri – Pelo sol de um novo canto
Cantando assim andei
Andando assim fugi
Fugindo assim voltei
Voltando assim sorri
Sorrindo assim chorei
Chorando assim amei
Amando assim eu morri
Morrendo assim foi que eu nasci
Pra andar, pra fugir, pra voltar
Pra sorrir, pra chorar, pra amar
Sempre assim
Rumo sem fim, dentro de mim
Pela estrada é noite, é madrugada
E eu vou seguir cantando
Quando eu nascer outra vez
Vou andar outra vez
Meu caminho na esperança
De um novo dia que vai despontar
Na manhã menina eu sou criança
Uma explicação adicional. Não tenho certeza, mas creio que havia uma letra original do próprio compositor Edino Krieger que foi, posteriormente, alterada (para melhor) por Vinicius de Moraes, neste arranjo.