Segunda, 31/10/2005

Iminência

Acompanhar a trajetória de uma bola de basquetebol até aquele momento em que se dá a certeza da bola entrar na cesta (ou não), para os pontos que definirão o jogo. Naquele átimo em que acabamos de constatar que a bola entrará (ou não) há quase um vazio instantâneo, antes da explosão de alegria ou de tristeza. Naquele brevíssimo instante, a parada do tempo, da vida, um infinito emocional e intelectual.

É um daqueles momentos únicos, impossíveis de serem guardados com precisão, dinâmicos por excelência, que apontam para o que virá a seguir, de forma cabal, finalística, impactante, podendo definir o futuro, função de decisão tomada, a partir de sua percepção, quando nos é dada essa possibilidade, já que, no caso da bola de basquete, somos passivos, cabendo-nos apenas esperar.

Não são passíveis de captura porque não são, propriamente, momentos. São a abertura de uma comporta que represa sentimentos extremos, vontades contidas, são pontes curtíssimas para o instante seguinte, este sim, pleno de significados, que depertam sensações, que geram ações.

Como qualificar o momento do aproximar de rostos, olhos fechados ou não, no primeiro encontro da ponta dos lábios, do primeiro beijo com a pessoa amada, que precipitará toda uma série de eventos de forte conteúdo emocional? A iminência do toque de lábios é elétrica.

E o que dizer do diálogo de um casal, da troca de frases que tangenciam, sem ultrapassar, o objeto que ambos desejam, mas não querem atingir, pelo menos no momento? Aquele jogo de aproximação e envolvimento, até o ponto (quase) limite para, voluntariamente, retrairem e ficarem, ambos, equilibrados no gume de uma faca verbal? Sairá, em algum ponto, da parte de um dos dois, uma palavra ou frase, que será lida ou ouvida, desencadeando tudo aquilo que estava sendo cuidadosamente delineado. A iminência é a leitura dessa palavra-limite, a tomada final de consciência, e a certeza do que virá, tudo isso num intervalo de tempo inexistente. Daí para frente é sentimento e ação.

A iminência é a antecedência imediata de uma decisão instintiva e carregada de emoção, à qual nos entregamos intensamente, sem racionalizações. Ela nos coloca diante de um abismo de flores ou de pedras, com a obrigação final do passo à frente.

A iminência é a confirmação de uma alegria maior ou tristeza angustiante, vista numa fotografia ultra-rápida. É uma cobrança de decisão que abre espaço para probabilidades que marcarão nossa vida.

Reviver exatamente aquele instante? Impossível. A alegria ou tristeza posteriores, sim. As ações consequentes, também. E só!


Escrito por Um Barco às 17h26


[ Comentários  ]