Sexta, 23/09/2005

Distâncias

A distância que me separa do que quero é muito maior do que minha capacidade de avaliá-la. Por isso mesmo não persigo, não sonho, não penso. Espero, apenas, que aquilo que quero me chegue de uma forma que eu nem perceba, de tal modo que me tome sem advertência e me deixe sem outra ação senão aceitar, por mais que eu, no íntimo a deseje e mesmo que, mentirosamente, a negue. Assim, tudo se justifica mais facilmente, tudo se encaixa, sem que eu tenha de explicar nada, principalmente a mim mesmo.

Não que o que eu queira seja permanente, uma vez que a vida é feita de pequenos quereres, de durações variáveis, medidas por vontades, desejos, coisas de emoção e, como tal, fora de parâmetros racionais ou físicos.

A distância que me une ao que eu preciso é mínima e facilmente percorrida, apenas para perceber, ao final, que o destino mudou ligeiramente de lugar e outra pequena distância me espera. Nada complicado, nada difícil, só que insatisfatório, por cotidiano, mesmo que se mostre fundamental, apesar de ser mais que suficiente.

A distância entre mim e o que necessito não existe, desde que me despoje de tudo que quero e despreze o que eu preciso, o que faria, talvez, com que eu me perdesse de mim mesmo, preço pequeno, quem sabe, para uma tal de paz interior que, em muitos casos, representa uma aceitação passiva, senão uma espécie de satisfação negociada comigo mesmo, quase uma trapaça.

A distância que me separa dos outros é inversamente proporcional ao interesse mútuo e à busca por algo que não seja, simplesmente, estar perto. É uma distância assimétrica, diferente nas duas direções e que tende a se tornar mais irregular e inviável, quanto mais emoção for usada como unidade de medida, deformando percepções, impondo perspectivas, acionando sentidos. Tende a ser intransponível.

A distância que me isola de mim mesmo é fluida, irregular, variável. Umas vezes me perco para, em outro momento, me descobrir mais forte e bem próximo daquilo que penso de mim. Em muitas outras vezes me sinto próximo de um ideal que eu criei para, em segundos, perceber que era miragem, que ideais não são idéias. E me vejo ao longe, tentando discernir em mim algo que não sinto, mas que está lá.

As distâncias entre o que quero, o que preciso e o que necessito são mínimas, pontuais até, e pouco me dividem no tempo, no espaço, no estar, na simplicidade de apenas ser. São, entretanto, enormes, abissais, no sentir.


Escrito por Um Barco às 18h32


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